quinta-feira, 15 de outubro de 2009

O Chato




Você já conheceu vários. Pelo menos uma penca em cada fase da vida. Não duvido que essa lata, atrás dessa tela ensebada, pertença a alguém dessa raça longe de extinção.

Estou falando dos chatos. Trata-se de uma categoria não-rara que se reproduz como gremilins. Espalham-se como a Gripe A; são temidos tal qual gravidez de ficante em circunstância de embriaguez; mas no fim das contas, todo mundo acaba se apegando a algum chatonildo. Pelo menos um, nem que seja só pra cantar "ele é chato, mas é meu amigo!".

Chatos são como o cravo enfiado no docinho; você tira porque é intragável, mas ainda fica o gosto de unha encravada no doce. Chatos são fruto da criatividade do bigbang, da ecleticidade do Criador. São para nos tirar da mesmice e nos provar que sempre pode haver uma companhia pior do que a solidão.

E não faça essa cara de "eusousuperlegal", pois ao menos alguma gota de chatice é inerente em cada ser humano. Ninguém está imune, é um fato biologicamente comprovado. Para a mulher, então, é institucionalizado pela TPM. Mesmo as que não têm útero usam-no como desculpa para esbanjar antipatia.

Para facilitar sua vida, peparo aqui um teste para que você, meu caro leitor, detectar pessoas enjoadas facilmente e, ainda, descobrir se pode se enquadrar ou não no clube dos chatos. Caso, ao final do teste, fique cientificamente comprovada sua condição de chatobaldo, não se preocupe. Faça pior: entre em pânico, já que nem os chatos se suportam. No máximo, você terá um amigo, que o aturará sem saber por quê.

Se, por outro lado, você se detectar no lado de fora do círculo satânico dos pé-no-saco, não solte fogos. A idade é mestra em sugar novas vítimas para o submundo da antipatia. Ou seja: não importa o quão legal você é hoje, o tempo é capaz de torná-lo um campeão mundial de pé-no-saquice.





TESTE #1: O grudento



- Difícil saber se o cara é chato por ser grudento ou grudento para ter companhias, já que ninguém atura tamanha chatice. O importante é que uma das características elementares de um ser desagradável é a sua insistência doentia em querer estar por perto da sua presa.

Uma pessoa assim comete sucessivos estupros fraternos. Ela não sacou que, assim como para um casal chegar à troca biológica, é necessária antes uma química para poder rolar a parte física, existe também uma matemática implícita para que nasça uma história de amizade.

O grudento é como uma doença crônica; não dá para vencer, temos apenas que aprender a lidar da melhor maneira possível para evitar maiores estragos. Não dar muita bola e responder perguntas monossilabicamente são remédios indicáveis, mas a superdose gera efeitos contrários aos desejados, tipo: "você está me ignorando? Por quê? O que eu te fiz?..." a cada cinco minutos.


TESTE #2: Sem graça




Reação comum diante de uma piada do chato


- Piada #fail acontece com todo mundo; se se achar O HUMORISTA sem um pingo de graça já complica. O pé-no-saco conta piadas que fazem todo mundo pensar "...?", e ainda solta gargalhadas. O chato fica no meio do caminho entre o engraçado e o tão-sem- graça-que-chega-a-ser-engraçado. Enfim, fracasso total.

Para se ter uma ideia da criatividade do chatonildo, em todo encontro de amigos ele conta as piadas dos cúmulos, dos pontinhos...

- Um ponto amarelo na praia?
- Hum...
- Rufles, a batata da onda! HAHAHAHAHAHHAHAHAHHAHAHAHHHHA HAHAHAHAHHAH AHAHHAHAHAHHHHA ai minha barriga, tá doendo...HAHAHAHAHHAHAHAHHAHAHAHHHHAHAHA HAHAHHAHAHAHHAHAHAHHHHAHAHAH essa foi boa, né não? AHAHHAHAHAHHAHAHAHHHHAHAHAHAHAHH AHAHAHHAH AHAHHHHAHAHAHAHAHHAHAHAHHAH AHAHHHHAHAHAHAHAHHAHAHAHHAHAHAHHHHAHAHAHAHA HHAHAHAHHAHAHAHHH!
- ¬¬




Marca registrada do chato

TESTE #3: Papo chato


- Não sabe conversar. Enquanto o papo sobre futebol está no auge, ele quebra o ritmo e solta algo como "vocês viram Ana Maria Braga ontem?". Os amigos se olham discretamente com cara de "ignoremodeon" e continuam falando como o Framengo está próximo de não conquistar nada de novo.

Para completar, o chato não deixa ninguém falar. Interrompe a frase dos outros no meio do papo e conta causos que não têm nada a ver com o assunto.


TESTE #4: Paga-mico serial


- Ele comete gafes e queima todo mundo. Diz que a amante perguntou pelo amigo, na frente da namorada. Fala mal de uma "velha loira lá do colégio, que usa a calcinha enfiada na bunda", sem saber que a mulher é mãe do colega ao lado. Enfim, tem um radar no subconsciente para detectar a pessoa, frase e a hora erradas.


TESTE #5: Mau gosto


- Só fala quando tem certeza. Certeza de que vai defecar pela boca alguma coisa que nunca deveria ter vindo à tona. Suas brincadeiras, piadas e apelidos são de péssimo gosto. Se acha super original por contar piadas anatômico-femininas no jantar do amigo muçulmano xiita, com toda a família do cara na mesa; de chamá-lo de viado na mesma mesa; de contar, no jantar, quando o cara foi flagrado pela coordenação pelado com uma menina no banheiro da escola; e de sugerir que Maomé era viado. Tudo na maior simpatia, achando que está CAUSANDO.


TESTE #6: Insistência


É possível ser um Demolay, revendedor de Herbalife ou evangélico legal. O que deveria ser proibido em lei era um chato se incluir em uma dessas três categorias. Se for as três juntas, trata-se de um teaser do anticristo.

Explico. Um chato que se preze é insistente. Então, quanto menos coisa ele tiver para te empurrar goela abaixo, menos danosa vai ser a companhia. Nesses momentos, o indicado é aceitar ir para o encontro, para que o cara pare de perturbar. Mas importante: não junto com o chato. Vá em outro horário e, não gostando, terá sua justificativa para se safar.

Se bem que não é necessário um motivo muito específico para o chato insistir. Se ele cismou que quer ir num bar novo que abriu na passagem da Ligação, na Terra Firme, vai encher o saco até conseguir levar os amigos lá.


TESTE #7: Reclamão


- Claro que ninguém precisa gostar de tudo. Óbvio que um mau humor circunstancial faz tudo à volta ficar pior. E ainda há quem fale mal de tudo por mero charminho, vá lá. A questão é quando, mesmo nas Condições Normais de Temperatura e Pressão, a pessoa acha tudo ruim. Ou pior: o chato consegue levar todo mundo para o bombante novo bar da Passagem da Ligação (com escolta da Rotam) e ainda é o primeiro a reclamar do lugar.

Se a cerveja estiver dois graus acima do ideal, está "quente parece mijo". Se não tem ar condicionado, o lugar é um inferno. Se tem, pergunta "quem é o esquimó que botou essa joça pra cuspir gelo?". Uma insatisfação irritante.


***


Recado aos amigos: Não pensei especificamente em nenhum conhecido meu ao escrever esse texto. Não seja paranoico achando que "o Filipe não me ama e resolveu expor isso pra todo mundo buáá!!". Então, quem ficar me perguntando "O chato do texto sou eu?" vai ouvir SIM como resposta, só por causa da pergunta.

Almoço regional



Almoço de feira VIP


Eu já tinha ido lá milhares de vezes, quase sempre para fazer matérias para o jornal. Mas, ontem, depois de já estar na rua de manhã, deu vontade de almoçar e tomar açaí de sobremesa. A Feira da 25 de Setembro me pareceu a melhor opção para fazer as duas coisas no mesmo lugar.

Ao chegar, o primeiro passo é o mais difícil: a escolha. Não do cardápio; mas sim de onde sentar. É complicado escolher uma das bancas, já que são todas iguais. Não há nem uma plaquinha do tipo "Broca da tia Zequinha", para se fazer um julgamento semiótico (!) que diferencie uma da outra. Fui andando meio perdido e logo uma das cozinheiras-caixas captou meu estado alfa e me interrompeu, perguntando se eu queria almoçar. Soou como um diferencial pra mim e aceitei.



O açaí que eu tomei não tem nada ver com esse da foto

Com o peixe pipocando na frigideira, não dava pra querer outro prato. Perguntei o preço, ela olhou rápido para esta face singela de rapaz bem nascido e criado em apartamento (só a cara, mesmo) e respondeu "sete reais". Simulei um princípio de ataque epilético e ela baixou para R$ 6. Manda.

Enquanto ela preparou a comida, observei a vizinhança. Quase todos são homens; mulher tem vergonha de comer em feira? Tem gente com cara de motorista de ônibus, de flanelinha, de feirante, de funcionários de pequenas empresas próximas e alguns, de fregueses da feira. O melhor é que parece uma festa. Todo mundo conversando e rindo enquanto come. Um clima de cordialidade e leveza que não se vê em restaurante algum, muito menos em intervalo de trabalho num dia de semana.

"Opa! Chegou a comida. Ótima.

"Manda o açaí. Ralo...

Caro, me enrolaram. Toma. Até mais".



Só pago quando vejo essa placa



Na saída, vejo quatro bancos de uma das barracas amarrados entre si por uma corrente com cadeado. Toda aquela cordialidade é cercada por ladrõezinhos mulambentos que não poupam nem bancos de madeira velhos, nos quais pessoas acima de 100kg devem temer relaxar os glúteos de suas nádegas.

Ando mais um pouco e vejo um papelão cobrindo o para-brisa do meu carro. Quando eu cheguei para o almoço, não tinha flanelinha. Tiro o papelão e aparece um jovem para pegar os trocados. Atrás dele, um velho muito invocado enxota o rapaz, que sai correndo. E meio a toda aquela leveza da feira, nego toma o lugar de flanelinha alheio para subtrair-lhe vinte e cinco centavos.

Peixe, açaí, feira, medo de roubo e pilantragem. Nunca me senti tão paraense.

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Regressão Telepática-religiosa



Candelária: origem da lenda, início da caminhada


"Feche os olhos. Respire profundamente. Solte um peido. Isso, silencioso, mortal. Não, não abra os olhos. Permaneça concentrado. Agora imagine uma multidão caminhando pela calçada de Copacabana. Mais gente. Mais ainda, como se fosse a espera para assistir os fogos da virada do ano, só que de dia. Isso, tipo aquele show dos Rolling Stones, pode ser. Todos caminhando lentamente, cantando ladaínhas. E de repente se ouve:

- Viva nossa senhora de Nazaré!
- Vivaaaaaaa!!!

"Imagine o arcebispo do Rio de Janeiro, Dom Orani, pegar o microfone e, do trio-elétrico que vai à frente da berlinda, começar a falar:

- Vamos, irmãos, sigam nessa demonstração de fé que permanece na cidade há mais de 300 anos...




Com a multidão e o calor, romeiros aproveitam para tomar um banho


"Dom Orani continua incentivando a caminhada, que começou na madrugada daquele domingo. Os fiéis que participam da romaria já demonstram estafa, após quase 10 quilômetros de chão. Segundo o Dieese, são 8 milhões de romeiros; a Polícia Militar calcula uns 5 milhões; para os evangélicos, são só meia dúzia de gatos pingados.

"O arcebispo continua falando no microfone, como desde o início da procissão, na Igreja da Candelária, no Centro da cidade. O religioso conta a lenda da capela, construída por um casal de espanhóis que encontrou a imagem da Santa várias vezes, depois que ela desaparecia misteriosamente da casa dele, na cidade. Pela imagem, o casal teria conseguido escapar de um naufrágio da embarcação, com o nome de Candelária.

"Ainda de olhos fechados, concentre-se no esforço das pessoas, no olhar das beatas ao céu, nos pés descalços dos jovens que seguram a corda, nas moças carregando objetos de cera. Não, ninguém leva barco de miriti na cabeça ou caranguejo no corpo. Mas tem um grupo de surfistas com pedaços de prancha, isso tem.

"Já estamos quase na chegada, em um palco montado em frente ao Forte de Copacabana. Durante o trajeto, as dezenas de equipes de reportagem - muitas internacionais - acompanham pela internet cada metro percorrido pela berlinda, por meio do GPS acoplado na coroa da Santa.




Técnico da festividade encaixa o GPS na coroa


"Sim, já pode parar de soltar pum. Era só unzinho pra relaxar. Na chegada da berlinda, o rei Roberto Carlos canta 'Nossa Senhora me dê a mão, cuida do meu coração, da minha vida, do meu destino...', enquanto a imagem passa na mão do prefeito, governador, presidente (quase deixa ela cair!), de um ator que bombou na última novela, de um ex-BBB, um cantor que a Globo tem empurrado goela abaixo...

"No palco, permanecem as celebridades nacionais para uma "missa" ao ar livre, apresentada pelo Faustão. Enquanto o padre Fábio de Melo canta a primeira música, a Santa, o arcebispo e o presidente saem, de helicóptero, para a Catedral Metropolitana. Lá, já estão esperando diversas personalidades internacionais VIP Plus. Angelina Jolie furou em cima da hora, porque estava adotando uma criança na Tasmânia. Mas compareceram Dalai Lama, Nicolas Sarkozy, Billy Graham e até a Madona, apesar da chiadeira dos mais xiitas, por conta de um antigo clip polêmico. Talvez tenha sido perdoada pela sua atual proximidade com Jesus. O Luz. Rá. Feche os olhos, não desconcentre. Foi só para relaxar.

"No Brasil inteiro, quem liga a TV na Globo se depara com o mar de gente, em uma transmissão apresentada por Fátima Bernardes, com comentários do padre Marcelo Rossi. Antes de cada intervalo, uma poesia incompreensível do Pedro Bial. É o dia inteiro nisso. Que nem no Criança Esperança.

"O Círio de Nossa Senhora de Nazaré do Rio de Janeiro acirrara ainda mais a rivalidade com São Paulo, Estado de origem da lenda sobre a Nossa Senhora Aparecida, padroeira do Brasil, fato não facilmente engolido pela Globo. No dia da santa paulista, logo depois da grande procissão, 12 de outubro, só dá matéria de Dia das Crianças na TV carioca..."



Anjo carioca com medo da "santa negra" de Aparecida

- Permaneça de olhos fechados, meu filho. Ainda não terminei...
- É que eu já tenho que ir
- Você vai para a trasladação?
- Não. Festa das Chiquitas.
- Hum...
- Mas a sessão de hoje foi bacana. Só faltou uma coisa: cadê o tal do almoço do Círio com a broca típica do Rio?
- Lá não tem comida típica.
- Ah, tá. Ó, outra coisa. Se o nosso Círio fosse pra lá, seria justo eles darem aquele carnavalzão pra cá, num é?
- Seria.
- Depois a gente conversa sobre o assunto. Até porque, na próxima, visualizar como teria sido a Revolução Francesa em São Tomé e Príncipe.
- Aí já não é mais francesa...
- A gente dá um jeito.
- E quando vamos começar as sessões de regressão para vidas passadas, para tratar seus traumas?
- Afff...deixa só eu imaginar como seria se o Albert Einstein morrido antes de...

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

E se as olimpíadas fossem em Belém?




Até os jogos, mais 30% do Portal da Amazônia serão executados


Confabulo comigo mesmo sobre a hipótese de a capital paraense ser escolhida para sediar os Jogos Olímpicos de 2016. Pra começo de conversa, só consigo imaginar o Pinduca fazendo festa com o mesmo sorriso quadrado, enquanto Anna Júlia e Duciomar disputam a tapa um beijo no Lula, sempre com o Ney Messias de papagaio de pirata involuntário ao fundo. Isso tudo ao som da banda Calipso, orgulho nacional dos bregueiros de Manga-city, tocando em um palco no Ver-o-peso. Clichê que impressiona a gringaiada.

Vem à minha mente a câmera que dá uma geral na plateia e faz um close nuns neguinhos caras-de-bandido, sem camisa e cabelos enloirados, fazendo um "T", no melhor estilo "mamãe sou bregueiro". Na saída da câmera, a imagem rápida de vários cartazes do tipo "Vamo subir, Papão", "Vamo cair, Leão", "Associação dos concursados manifesta seu repúdio por..." ops!, esse último não deu pra ler todo.


A cantora antes de colocar 540ml de silicone

A câmera volta aos importantes. Na ala VIP, teríamos aquelas celebridades da nossa terra. Sim, aquelas latas manjadas que a gente vê há 20 anos. Claro que não seriam as únicas presentes; haveria várias de naipe nacional. Mas o câmera foi pago por fora para filmar só as "nossas". Por exemplo, penso no Verequete quieto, sendo sacudido e cercado por uma turba saltitante, com o olhar no infinito e além, como quem não sabe o que está acontecendo. O governador de São Paulo Nilson Chaves chorando, Lucinha Bastos e Dira Paes se abraçando - com o Robgol ao fundo, de papagaio de pirata voluntário - , Fafá de Belém...bem, eu só imagino ela exibindo os peitos com um decote enorme. E dando uma risada gótico-diabólica a cada cinco minutos.

Emocionado com a vibração do público, o presidente do Comitê Olímpico Brasileiro desce do palco e abraça a galera da frente. Um puxa daqui, outro puxa de lá, e ele começa a tentar se sair, com um sorriso sem graça, até que escapa, aliviado. Só quando voltar ao hotel vai dar a falta da carteira.

Na semana seguinte, a população da cidade se dividiria em dois blocos: os que criticam a escolha, por saberem que Belém não tem capacidade para sediar os jogos; e os empolgados que comemoram e elogiam a escolha da cidade, mesmo sabendo que Belém não tem capacidade de ser sede. Nem da seletiva regional indígena de pinball para portadores de síndrome de down.

O Lula daria entrevista falando da importância de uma Olimpíada na Amazônia, devolvendo a auto-estima dos índos que moram aqui. Aproveitaria para cometer mais umas duas gafes e faria os jornalistas rirem com umas cinco piadas. Em seguida, a Ana Júlia falaria qualquer coisa que decorou para a campanha de reeleição, cometeria cinco gafes e contaria oito piadas sem graça. Para completar, o Duciomar pegaria o microfone e...os jornalistas começariam a levantar, por achar que o baixinho com cara de Luigi sem bigode era só o auxiliar de som.


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ESTRUTURA

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O alojamento da Argentina será um dos melhores


Vêm à minha cabeça promessas fabulosas, como a construção de um grande parque aquático na Ilha das Onças, em frente ao Ver-o-peso. Para facilitar o acesso, uma ponte do naipe da Rio-Niterói. O resto do equipamento esportivo ficaria ao redor do Mangueirão, abocanhando o terreno da marinha e mandando as forças armadas para qualquer terra distante.

Na hora AGÁ, só uns 18% das promessas seriam cumpridas. As provas aquáticas acabariam em uma Escola de Educação Física recauchutada, porque a ponte mal saiu do papel. No mangueirão, a capacidade do estacionamento ficará reduzida à metade, já que o governo não conseguiu desocupar tudo a tempo. Flanelinhas faturam. Life goes on.

Em termos de infraestrutura, até os jogos, o prolongamento da avenida Independência terá avançado cerca de 7,3% rumo ao nada; a prefeitura comemorará como se tivesse ganhado a Copa do Mundo ao completar metade do Portal da Amazônia, após conseguir verba extra com a venda subfaturada do Palácio Antônio Lemos para a McDonalds; e o viaduto da Julio Cesar com a Pedro Álvares Cabral será inaugurado uma semana depois da festa de encerramento das Olimpíadas.

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ESPORTIVIDADE

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O perfeito simbolismo do nosso mascote-rei

Em termos de esporte, o Brasil continuará uma potência mundial da América Latina lusófona. Os papa-chibés ufanistas vibrarão com a participação de um paraense que é goleiro reserva da seleção de handebol, pelo histórico resultado da 9a colocada nos jogos.

Ainda não foi é vez que o futebol ganha sua primeira medalha de ouro. O Neymar, com 24 anos, pipocou à la Robinho e o lugar mais alto do pódium foi para a Venezuela, como previu Hugo Chavez. O vôlei perde por marra, mas ganha todos os outros campeonatos disputados num raio de três anos e meio.

Outros esportes que metade da população não sabia que existiam entrarão no foco da mídia por conta de brasileiros fora-de-série. Tô sentindo que vem medalha de ouro aí em esgrima e em luta greco-romana. É uma forma de substituir os ouros então já aposentados de atletismo e de vela.

No fim das contas, todo mundo ficará satisfeito por que o Brasil ficou meia medalha de bronze à frente da Argentina e conseguiu mais pódiums do que nos jogos anteriores. Amém.


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AVALIAÇÃO FINAL

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Ficamos de recuperação nessa...


Os jogos olímpicos em Belém serão um fracasso retumbante sob qualquer ponto de vista. Para os ufanistas, obviamente, porque a história não foi tão colorida quanto eles pintaram. Para os apocalípticos, porque não foi tão ruim assim quanto profetizaram. Sequer uma catástrofe acontecerá.

Durante os jogos, a maior reclamação dos estrangeiros será quanto ao calor infernal, alternado a temporais dilúvicos. Atletas desmaiando durante as provas e chefes de delegação escrevendo "bem-vindos ao Congo em labaredas flamejantes" pelas paredes. Mas não será grande problema. Dois meses depois a imprensa internacional esquecerá que um dia o Brasil sediou a Olimpíada. Life still goes on.

Nossas peculiaridades, como os jacarés andando pela rua, as índias nuas seduzindo os dinamarqueses e, principalmente, os peitos da Fafá de Belém pulando para fora do sutiã GGG, suplantarão quaisquer problemas técnicos. Todos ficarão boquiabertos quando nossa pira olímpica for acesa de forma espontânea, ao ser encostada no asfalto da Almirante Barroso ao meio-dia. Afinal - convenhamos - ninguém esperava um primor técnico.


No final das contas, tudo será uma festa.


Pensando bem, até que do Rio de Janeiro para Belém não tem tanta diferença assim, né não?