A essa altura já percebi: vou sentir falta de muita coisa.
No começo da academia o clima era tão tenso que eu não achava que fosse
dizer isso, mas tem um monte de coisa de que vai deixar saudade, assim que
pisar no avião pra sair de Brasília.
Vou sentir falta das disputas entre linha um e linha dois do tiro. Das
rodinhas de piadas dos cariocas, que faziam minha barriga doer de tanto rir.
Das comparações absurdas que fazíamos, entre pessoas da sala e imagens de
slides e vídeos das aulas. “Olha lá o anjinho”, diria o Mariath.
Vou sentir falta das piadas. Até das piadas forçadas. Sobre gaúchos,
sobre os conhecimentos elétricos do Damasceno, sobre o Alves perguntando “quem
vai cozinhar?”. A primeira vez das piadas era muito engraçada, mas as
repetições infinitas pareciam ser uma busca ardente por criar um clima mais
brando, entre tantas regras, rankings, proibições, incertezas que nos cercavam.
Vou sentir falta dos brados engraçadíssimos nos deslocamentos, do recuo
da MP5, das papis bonitas, dos luaus malucos (que infelizmente elas nunca
participavam), dos desenhos do Karam. De ouvir coisas tipo “professorrrr”,
“aíeh galiera”, “aí gurizada”, “ei cagalhão”, “ô meo” e “booooa professor!”.
Não vou sentir falta de tudo, claro. Não vou sentir falta do arroz e
feijão, que parecem ter sido cozidos uma vez em quantidade suficiente pros quatro
meses e requentado diariamente pra gente. Nem do bife, que às vezes tinha a
consistência da sola de um coturno. Mas vou sentir falta do salmão. O macarrão
era quase sempre muito bom. A feijoada de sexta também.
Não vou sentir falta da impressão de morte iminente de cheirar o gás
lacrimogêneo. Mas vou sentir falta da sensação que vem depois, de vitória, de
me sentir capaz, de me sentir cada dia mais cascudo.
Não vou sentir falta da agonia de ver um colega da turma estar a um
passo de ser desligado do curso. Mas, com certeza absoluta, uma das coisas que
mais me farão falta é a alegria de ver esse mesmo colega vencer, e a satisfação
de ver a turma unida em torno de um objetivo. Depois desse dia a turma Eco
nunca mais foi a mesma.
No fim das contas, chego à conclusão de que, quase tudo que me fará
falta na ANP, vem de vocês. A maior parte de tudo que vivi de bom, de tudo que
me fez sorrir nos últimos quatro meses, foi meio da convivência com colegas e
amigos que fiz aqui dentro.
Eu sei que se tornou repetitivo falar isso, mas sinto um imenso orgulho
de ser considerado um de vocês. Me sinto como um irmão adotivo, que no começo
causa uma certa estranheza, mas logo passa a ser como um irmão de sangue. Sou
um de vocês.
***
Desde que me caiu a ficha, durante discurso do ministro da
Justiça, da batalha que havia finalizado, fiquei engasgado, até o resto do dia.
É aquele choro represado, que a gente fica esperando a melhor hora de deixar
escorrer. Deu vontade durante os discursos; também ao fim da cerimônia, nos
brados espontâneos da academia inteira; de novo lá na sala, nos abraços de
despedida; mais uma vez ao esvaziar o alojamento, entrar no carro e ver a
academia passar, olhando o asfalto e lembrando de quando corríamos em pelotão.
Chorar mesmo, só quando cheguei em casa.
O resto do dia foi um turbilhão de memórias me rondando.
Interessante que eu citava como me sentia e ninguém parecia captar sequer uma
fração. “Ah é? Legal”, era o que se respondia, diante da tentativa falha de me
expressar.
O sábado foi um daqueles dias que a gente sente saudade por
antecipação. Tivemos pelo menos outros quinze sábados sem sentir um pingo de
falta. No último, dói, porque a gente se acostuma com o convívio. Dói porque
pessoas são insubstituíveis. Dói porque são 37 que, provavelmente, nunca mais
estarão juntas ao mesmo tempo.
Mas é sempre assim. A academia é uma catapulta. Junta-se um
grupo de todos os cantos do país para que fiquem quatro meses juntos e, depois,
dispersa-se o grupo para mais longe ainda. Sorte de quem vai junto.
Vai ser bom
estar em Guaíra, Cuiabá, Porto Velho...
É isso. Equipe é equipe, está sempre junta, mesmo longe.
E quando perguntarem "que turma é essa?", soltem aquele grito:
ECO!