Mr. Smith na strato
Até os 15 anos, poderia ser confundido com qualquer adolescente roqueiro de Londres. Inclusive quando largou a escola, começou a tocar guitarra e formou uma bandinha com colegas. A mudança começou quando foi convidado para tocar em uma banda que estava no limiar do sucesso global.
Seguido ao estouro, fez milhares de turnês, vendeu milhões de álbuns e passou a ser considerado um dos melhores e mais influentes guitarristas do mundo.
Na sexta-feira, conforme havia se comprometido, pegou o telefone e...
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Até os 15 anos, poderia ser confundido com qualquer outro metido a roqueiro de Belém. Começou a tocar guitarra na adolescência, formando bandinhas com amigos. Chegou a ser considerado o melhor jornalista do quarteirão, do desabitado bairro onde vive às custas do pai.
Na última sexta-feira, conforme o esperado, ouviu o telefone tocar, atendeu e...
- Hello, my name is Filipe and i`m a journalist from Belem
- Oi.
- Hehehehehe oi.
Mr. Che Philips na strato
Foi assim que dois caras com realidades totalmente distintas começaram um diálogo de 12 minutos por telefone. Um estava dentro de uma redação cheia de jornalistas, enquanto que o outro, presumo, estava cercado de mulheres semi-nuas oferecendo um drink naquelas taças que parecem funil, com uma frutinha pendurada. Ao menos assim imagino, embora eu não tenha ouvido sussurros femininos. Talvez porque a mulher estivesse ocupada com ...ah, não me interessa.
Mas, convenhamos, pra quem só tinha entrevistado celebridades do tipo Roberto Jeferson, Mulher Melancia e Jerry Adriani, falar com Adrian Smith, um dos guitarristas da lendária banda de heavy metal Iron Maiden, é uma leve subida de nível. Igualmente incomum foi eu ter entendido 91,2% do que ele falou, sob um inglês britânico com o qual parecia, em vez de expelir, engolir algumas palavras. Por exemplo, a pronúncia dele de "Iron Maiden" era algo do tipo "ao mêdn".
Também me chamou atenção a intensidade do uso de bengalas de linguagem como "é...", "poisé", "então", "tipo..." e "...você sabe...". Chegou até a gagejar uma ou outra hora, pra achar as palavras de forma a ser melhor entendido. Mas claro, manteve uma distância segura da vergonha que passou o repórter com seu inglês em avançado estágio de oxidação.
Também fiquei decepcionado com o atraso dele, logo um sir britânico. Ligou três minutos depois do combinado. O papo foi rápido, mas até rendeu. Só não deu tempo de eu passar umas dicas de guitarra pra ele. Fica pra próxima.
Só uma observação importante: não fui o único responsável pelo resultado dessa entrevista. Escalada para tal labor, a Andressa Gonçalves me passou a bola porque foi marcado para um horário que ela não podia. Como um bom sanguessuga que sou, aproveitei algumas perguntas que ela já tinha formulado e assumi sozinho os méritos por esse grande feito.
Mas falando sério, agradeço ela por ter confiado em mim para a entrevista e por ter deixado eu aproveitar de um trabalho que ela já tinha feito. Em outras palavras, ela driblou o goleiro e tocou pra mim.
A expectativa pela chegada da turnê The Final Frontier a Belém domina não só o público, mas também os integrantes do Iron Maiden. Em entrevista pelo telefone, o guitarrista Adrian Smith, 54 anos, demonstrou que a ansiedade pelo show não é exclusiva dos fãs. Ele se disse animado para conhecer o público da cidade, uma das poucas dessa turnê que ainda não foi visitada pela banda.
Quando o assunto é Brasil, integrantes da banda logo lembram as memoráveis apresentações nas três edições brasileiras do Rock In Rio, tema citado com nostalgia por Adrian. Não é à toa que o país é um dos mais privilegiados nessa tour, com seis apresentações da banda; só perde para Alemanha e Austrália, ambos com sete.
Um três guitarristas do Iron Maiden, Adrian é inseparável do vocalista, Bruce Dickinson. Entraram na banda na mesma época, no início da década de 1980, pouco antes de o grupo estourar mundialmente com o álbum Number of The Beast. No início da década de 1990, saíram para lançar dois álbuns solo, e voltaram em 1999. Adrian participou da gravação dos últimos quatro CDs da banda, inclusive o aclamado The Final Frontier, lançado ano passado e base do repertório da atual tour.
Com linguagem coloquial e simpatia, Adrian falou sobre Grammy, o sucesso do novo álbum e lembrou seus tempos de fã da banda Deep Purple.
O Liberal - Você sabia que um grupo de fãs esperou uma fila de 15 horas até que os ingressos começassem a ser vendidos, em novembro?
Adrian Smith - Sério? Isso é espetacular.
O Liberal - Eles queriam ser os primeiros a comprar ingressos.
Adrian Smith - Isso é ótimo! Nunca tocamos em Belém antes, então estamos curiosos para ver. No resto do Brasil as reações, desde que tocamos no Rock In Rio, há 20 anos, têm sido fantásticas. Então, parece que vai ser um bom show, sabe?
O Liberal - Iron Maiden deve ser a maior banda a tocar em Belém. Isso faz o show ficar ainda mais especial para vocês?
Adrian Smith - Sim, é sempre excitante ir aonde você ainda não tinha tocado. Então, é claro que estamos animados. Estamos tocando em muitos lugares nessa turnê e pouquíssimos deles ainda não conhecíamos, e Belém é um deles. Estamos animados com isso.
O Liberal - Porque a banda toca em lugares fora do grande circuito, onde outras grandes bandas não costumam ir, como Indonésia, Cingapura e agora Belém?
Adrian Smith - Eu acho que as coisas estão muito diferentes e mudando rapidamente com a internet. As pessoas têm mais acesso a músicas e bandas. Acho que por isso Iron Maiden se torna mais conhecido. Nós estamos em um avião enorme, o Ed Force One, então somos capazes de chegar a esses lugares. E a gente sempre toca onde a gente sente que deve tocar. Quando surge uma possibilidade de tocar em um lugar diferente, a gente sempre leva em consideração a hipótese. Nós temos meios para ir até lá, nos divertir, então, você sabe, porque não tocar lá?
O Liberal - Em uma entrevista para a revista Roling Stone da Indonésia, Bruce Dickinson (vocalista do Iron Maiden) não pareceu muito empolgado por ter ganhado o Grammy esse ano. Isso não significou nada para a banda?
Adrian Smith - Bem, para ser honesto, eu não sei bem... assistindo a cerimônia do Grammy a gente percebe que é tudo muito “showbusiness”, muito “Hollywood”, enquanto que Iron Maiden está a milhões de quilômetros de distância disso. Preferimos parecer uma banda real, cometemos erros, não somos perfeitos. Eu acho que as pessoas apreciam...(silêncio)... eu quero dizer, nada contra o Grammy, é legal ser reconhecido. Então, é, eu quero dizer, você sabe... por outro lado, muita gente vai dar importância ao Grammy e eu não vejo nada de errado nisso. Se, se, se...se isso faz as pessoas ficarem curiosas sobre a gente, então está ótimo.
O Liberal - Em uma mão vocês têm o Grammy, mas na outra, vocês estão no topo das paradas em 28 países. Imagino que isso signifique mais...
Adrian Smith - Sim, exato. É incrível.
O Liberal - E é o último álbum, e não uma coletânea de músicas antigas, que as pessoas estão ouvindo e adorando. O que isso significa para você?
Adrian Smith - Bem, a gente acha que é importante criar e tocar novas músicas. Pessoalmente, eu acho muito satisfatório escrever algo e ser criativo. Eu imagino que nós poderíamos sair em turnê e tocar nossas músicas antigas, o público provavelmente ficaria bastante feliz. Não queremos isso; queremos criar novas músicas, fazer novos shows e realmente continuar a nos desafiar.
O Liberal - Qual é a principal diferença entre os seus primeiros fãs, dó início da década de 1980, para os atuais, que vão para os shows hoje em dia? Há muitos jovens hoje; eles são diferentes dos jovens que iam aos shows de 30 anos atrás?
Adrian Smith - Bem, os jovens da década de 1980 ficaram mais velhos (risos). É verdade, temos muitos fãs jovens, o que é maravilhoso. Quem me dera que eu soubesse o segredo; eu iria engarrafá-lo e vendê-lo. Eu acho que parte do motivo é porque não há muitas outras bandas fazendo isso.
O Liberal - Por que será?
Adrian Smith - É muito incomum uma banda estar na ativa por tanto tempo quanto Iron Maiden, sabe, e continuar em turnês e manter o ritmo... E, eu acho que um monte de jovenzinhos que vêm aos nossos shows nunca estiveram em uma apresentação de rock antes, nunca viram alguém tocando solos de guitarra e nunca ouviram as melodias. Em muitas bandas que você ouve há uma atitude heavy metal e têm o som pesado, mas se você parar para ouvir nosso som, vai perceber que há muito de melódico.
O Liberal - Mas os fãs de hoje são, em algum aspecto, diferentes daqueles de muitos anos atrás?
Adrian Smith - Não. Eu lembro quando eu era criança e fui ver Deep Purple. Foi muito emocionante ver uma banda de rock e os caras tocando os instrumentos, muito legal. É isso que a juventude quer ver, ao menos é a única coisa que eu posso imaginar que eles possam querer. Com certeza não é pelas nossas aparências.
O Liberal - Vocês foram influenciados por Deep Purple, mas também influenciaram muitas grandes bandas como Dream Theater e Metallica. Como você se sente em relação ao fato de que o primeiro show que eles assistiram, quando jovens, talvez tenha sido o seu e agora eles contam histórias semelhantes à que você contou agora?
Adrian Smith - Pois é, estamos na estrada por um bom tempo, fazendo muitos shows em muitos países, para muita gente, o que acaba influenciando muita gente. Você nunca esquece o primeiro show que viu. Acho que as pessoas pegam essa inspiração para alimentar sua própria criatividade. Isso é ótimo.
O Liberal - Os fãs brasileiros devem estar curiosos de por que o país não vai aparecer no próximo DVD, enquanto que Argentina e Chile foram escolhidos. O que você diria a esses fãs, já que eles podem ter ficado com um pouco de ciúme?
Adrian Smith - Bem, você sabe, nós já fizemos o Rock In Rio e não se pode fazer algo maior do que aquilo.